“Em memória dos nossos que tombaram vítimas do vírus e do descaso”
FUNDASP já tem o projeto vencedor do concurso Memorial-Covid para a instalação de um monumento no campus Monte Alegre da PUC-SP.
|
Da esquerda para a direita, Dra. Ana Paula Maciel, da Consultoria Jurídica da FUNDASP, Dra. Ana Paula Grillo, Chefe da CJ da FUNDASP e presidente da Comissão Julgadora, arquiteta Ana Maria Eder, gerente da DIPLAD e arquiteto Márcio Lima, da Cúria Metropolitana de São Paulo
Fonte: FUNDASP
|
No dia 23/12, a Comissão Julgadora do Concurso para a instalação do Memorial-Covid da FUNDASP, tendo como presidente da Comissão a Dra. Ana Paula A. Grillo, procuradora da FUNDASP e Chefe do Setor Jurídico, e composta pela arquiteta Ana Maria Eder, gerente da DIPLAD e pelo arquiteto Márcio Lima, arquiteto da Cúria de São Paulo, depois de sessões intensivas de análises do grande número de projetos concorrentes, puderam, finalmente, chegar à eleição do projeto vencedor: trata-se do projeto da profa. Dra. Maria do Carmo Vilariño.
|
Profa. Maria do Carmo Vilariño, em entrevista na sede da FUNDASP
Crédito das fotos: Cláudio Junqueira
|
A professora Dra. Maria do Carmo Vilariño é mestre e doutora pela FAU-USP, e professora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie e do mesmo curso na Faculdade Escola da Cidade, além de outras Universidades. Integra, desde 1991, o escritório Projeto Paulista de Arquitetura S/S Ltda, da qual foi uma das fundadoras. Ganhou diversos prêmios de Arquitetura e Urbanismo, sendo alguns dos últimos o 2º Prêmio no Concurso Público Nacional de Arquitetura para a Casa da Sustentabilidade – Parque Taquaral, promovido pela Prefeitura Municipal de Campinas e IAB-SP, em 2015, e também o 1º Prêmio no Concurso Público Nacional de Arquitetura e Urbanismo Renova SP – Lote 21 Meninos 1, promovido pela Prefeitura Municipal de São Paulo e IAB-SP, em 2011, entre outros.
Veja, abaixo, um resumo da entrevista concedida pela profa. Maria do Carmo, na sede da FUNDASP, em 04-01-22. Participaram da entrevista: Arquiteta Ana Maria Eder, gerente da DIPLAD, jornalista Cláudio Junqueira, chefe da ACI/PUC-SP e Rachel Balsalobre, assessora de imprensa da FUNDASP.
“Acho que existiam aqui duas questões importantes neste projeto. A primeira é que é um monumento público, então quando fomos escolher o sítio, a gente queria que ele tivesse uma visibilidade importante para a cidade, porque foi dada a liberdade de escolher qualquer outro lugar para a colocação. E a segunda questão era considerar o patrimônio tombado e os elementos já existentes neste recinto, como um busto já existente no local, ou seja, já era um local de celebração, digamos assim, de questões institucionais.
É importante comentar que este projeto começou com uma reminiscência do projeto da Carla Juaçaba, não sei se vocês conhecem, aquela capela a céu aberto do Vaticano em Veneza, que é um projeto maravilhoso, onde ela também trabalhou com este tipo de tubo, onde ela faz uma capela minimalista, ela faz uma cruz, uma haste e um banco, quer dizer: isto já representa este caráter espacial e sacro, e fiquei muito impregnada desta ideia”.
|
Capela a céu aberto do Vaticano em Veneza, obra da arquiteta brasileira Carla Juaçaba, citada pela entrevistada Maria do Carmo Vilariño, como uma de suas inspirações.
Fonte: Designboom
|
“Sempre esteve presente esta ideia de ser um material que reflete, ora ele mostra, ora ele esconde, ele mimetiza todo o entorno, a paisagem. Isso evoca muito para mim esta questão de as pessoas que estavam presentes, vivas, e, de repente, não estarem mais, esta ruptura absurda... estavam aqui e não estão mais, muitas sem processo de luto, sem um adeus...! E então queríamos trazer – e o material, aço escovado, dava esta condição - de ser alguma coisa que, ao mesmo tempo que refletisse o entorno, as pessoas, as árvores, também tivesse esta propriedade de mostrar e esconder – essa ausência e presença”.
O espaço
“E aí estudando este recinto, temos uma praça, que é muito usada pelas pessoas, os bancos, e a própria calçada, que é mais pública. Então achei esta primeira ideia, este plano que une estas duas situações, uma mais privada e uma mais pública. Então, para a pública vai figurar a frase principal, - “Em memória dos nossos que tombaram vítimas do vírus e do descaso” -, a frase que faz a homenagem às vítimas em geral.
E aproveitando o desnível do terreno, que tem o desnível para essa praça mais privativa que também é pública, mas que é mais interna, criei este degrau para acomodar os nomes das pessoas da comunidade, e também criar a possibilidade de você colocar uma flor, fazer alguma homenagem.
Lembrei muito daquele monumento de Nova York, das vítimas, onde você tem as letras dos nomes recortados e as pessoas colocam flores.... Então pensei de aqui poder ser algo – até pela presença dos bancos – de você poder ficar neste lugar, lembrar destas pessoas... E para a cidade, ficar esta passagem...!”
Seis hastes
“São seis hastes, e a minha ideia era marcar este número seis pelas 600 mil vítimas. A gente lembra deste número. Lembra quando chegamos a este ponto. É por isso que são seis hastes. Primeiro criei um chanfro, lembrando um pouco dos pináculos das igrejas, estava tentando dar um caráter sacro... esta ideia da cruz, que nasceu lá atrás, eu estava percorrendo esta ideia, de buscar algo que evocasse a infinitude... e então busquei dar este acabamento nas pontas, que, como ele é chanfrado, se vê esta cruz. Considero que não atrapalhava esta questão da contemplação – se trouxesse isto até lá embaixo já ficavam muitos elementos... -, bem, aí já é um processo estético.
E a outra questão, que era importante, era tornar este recinto mais público. O jardim, do jeito que ele está, não permite olhar tão bem os outros espaços e até o edifício que está atrás. A ideia de torná-lo mais público era de eliminar as muretas, de tirar estas touceiras e criar uma coisa mais permeável visualmente, dando um caráter público a todo o jardim, permitindo que tudo seja visto, convidando o olhar e a presença, permanência e contemplação”.
A pandemia não acabou
Durante a entrevista esclareceu-se que a frase a ser gravada, e que fica visível para a rua, é: “Em memória dos nossos que tombaram vítimas do vírus e do descaso”, como um monumento da FUNDASP, representando as duas mantidas, PUC-SP e ASSUNÇÃO.
O projeto indica, também, o espaço destinado à gravação dos nomes das pessoas que pereceram, assim como - olhando para uma triste e indesejável possibilidade -, deixando espaço para gravações futuras, uma vez que ainda estamos atravessando a pandemia, e que elementos negacionistas impensáveis vêm novamente pesar em nossos horizontes, com a recusa e atraso para o início da vacinação das crianças, além do recrudescimento da contaminação por uma nova cepa do vírus que, embora aparentemente menos letal, é mais contagiosa.
Ponderou-se, também, sobre as potencialidades do material escolhido para a confecção das seis hastes, o aço escovado, que, por sua característica, espelhará todo o entorno, a vegetação, o busto ali instalado, a lateral da capela, a fachada histórica da PUC e o próprio passeio e as pessoas, rebatendo e integrando-se ao ambiente já pré-existente, e constituindo-se num Memorial que produzirá imagens cambiantes de presença-ausência, indo diretamente ao encontro de seu objetivo, que é a contemplação, a lembrança, a onipresença daqueles que se foram, como uma homenagem e uma prece cada vez que alguém dedicar alguns minutos a esta contemplação.
Inauguração
Ana Maria Eder esclareceu que, agora, será iniciado um processo de submissão do projeto ao CONDEPHAAT e outros organismos que apreciam e autorizam intervenções em bens tombados da cidade, e que só então as obras serão iniciadas. Ela esclareceu que é impossível estabelecer um cronograma ou sequer fazer uma estimativa, mas que certamente este processo levará alguns meses, de modo que provavelmente a inauguração não acontecerá até o meio do ano. Esclareceu também que, pela mesma razão – a dependência da autorização das autoridades competentes – imagens do projeto não podem ainda ser divulgadas, uma vez que este pode sofrer alterações para se adequar às exigências do CONDEPHAAT.
Porém, com uma coisa pode-se contar: que o ano de 2022 terminará com a perene homenagem da FUNDASP fincada no solo da Universidade, para que não se relegue ao esquecimento aqueles que nos foram arrancados por duas pandemias, a do vírus da Covid-19 e a do descaso de um governo federal que infelicita seu povo.
|